Um sábado desses, como de costume, estava a caminho do curso para pegar a minha namorada. No ônibus tranqüilo, lia “O Processo” do Franz Kafka, e todo o seu existencialismo e angústia frente ao mundo moderno e a massificante burocratização da vida humana, urbana. Algo me chama a atenção lá fora, um homem agride uma mulher, que julgo ser sua esposa, pois ao lado um garotinho assustado assiste tudo, não devia ter mais que três anos. Fico perplexo, olho para os lados, na calçada, vários homens assistem tudo como se estivessem assistindo mais um capítulo da novela das oito. Logo ao lado, um caminhão de mudanças é descarregado por no mínimo quatro homens – e ninguém faz nada.
O “homem” puxa os cabelos da esposa e em seguida lhe dá uma forte gravata. Eu me desespero, lembro que no ônibus, haviam dois policiais. Chamo as suas atenções e lhes aviso do ocorrido, já imaginando o ato heróico destes destemidos guardiões do povo. Os imagino gritando “Abre a porta aí motô” e logo em seguida correndo para salvar a pobre moça indefesa. Triste engano o meu, pois um dos policiais só dá uma olhadela por cima da janela, para logo em seguida balbuciar alguma coisa ininteligível, e só. Uma mulher sentada na frente dos policiais grita: “Que covardia, chamem a polícia”, e eu penso: “Seria cômico se não fosse trágico”.
Parecia que eu havia me transportado para um mundo Kafkiano, aonde nada funciona, e o individualismo e a indiferença falam a língua dos anjos. Sem querer parecer sexista ou machista (coisa essa que condeno), bons tempos eram aqueles em que os cavalheiros salvavam as damas das mãos dos malfeitores, para ganhar um beijo ao final, com direito a um pezinho levantado e tudo o mais. Mas, não estamos num conto de fadas que tem um final feliz. Essa história é uma história Kafkiana, não temos heróis, ou pelo menos não temos finais felizes. O mocinho sempre morre no final, esquecido, afundado na mais profunda merda, lentidão e descaso do sistema. Nesse livro o mocinho não usa gel, não casa, não tem quatro filhos e um cachorro, e nem mora em uma bela casa branca com cerca e um grande jardim florido. Nesse livro a verdade é outra, pois as cercas são as cercas da prisão, do estado, do medo e o seu cão, esse é um Vira-Latas pulguento chamado Xôla.
Vejo que poucos policiais fazem o que fazem por que gostam. Talvez aqueles que quando crianças imaginavam revólveres com qualquer graveto ou objeto, e passavam tardes inteiras brincando de polícia e ladrão. Mas o que me parece, é que muitos têm um sério problema de conduta e respeito – esses tem os dedos nervosos prontos para dar um tiro no primeiro dentista negro que dirija um belo carro, por confundi-lo com um bandido. Muitos, não fazem diferença entre o valor da vida e do respeito, e só querem uma desculpa para descontar suas frustrações e angústias. Por que eles iriam se incomodar? Tratava-se de um casal de baixa renda, desses que vão à praia aos sábados e domingos e passam a tarde escutando brega e enchendo a cara de cachaça. Não são gentes para o estado, são um estorvo para a elite, e muitos policias levam essa mentalidade tacanha para a vida, mesmo estes não fazendo parte dessa facção criminosa, elitista e demagoga.
Enfim, o ônibus começa a andar – minhas esperanças já haviam se esvaído por completo - quando percebo outros dois policiais na rua, correndo em direção ao casal, prontos para por um fim naquilo. O ônibus se distância, fico um pouco mais tranqüilo, mas meu semblante é de ódio, ódio por aqueles policiais omissos. Tento voltar a ler – já não consigo mais. Pois já estamos num mundo ora Kafka, ora Dom Quixote. Que sorte aqueles policiais com armas de gravetos, terem aparecido pra salvar a donzela dos braços do grande dragão de pedras. Mesmo assim meu semblante não muda, pois sei que no final, nem o Gregor Samsa e nem o Josef K saem ilesos, pois é assim no mundo de Kafka, e é assim no mundo real.
O “homem” puxa os cabelos da esposa e em seguida lhe dá uma forte gravata. Eu me desespero, lembro que no ônibus, haviam dois policiais. Chamo as suas atenções e lhes aviso do ocorrido, já imaginando o ato heróico destes destemidos guardiões do povo. Os imagino gritando “Abre a porta aí motô” e logo em seguida correndo para salvar a pobre moça indefesa. Triste engano o meu, pois um dos policiais só dá uma olhadela por cima da janela, para logo em seguida balbuciar alguma coisa ininteligível, e só. Uma mulher sentada na frente dos policiais grita: “Que covardia, chamem a polícia”, e eu penso: “Seria cômico se não fosse trágico”.
Parecia que eu havia me transportado para um mundo Kafkiano, aonde nada funciona, e o individualismo e a indiferença falam a língua dos anjos. Sem querer parecer sexista ou machista (coisa essa que condeno), bons tempos eram aqueles em que os cavalheiros salvavam as damas das mãos dos malfeitores, para ganhar um beijo ao final, com direito a um pezinho levantado e tudo o mais. Mas, não estamos num conto de fadas que tem um final feliz. Essa história é uma história Kafkiana, não temos heróis, ou pelo menos não temos finais felizes. O mocinho sempre morre no final, esquecido, afundado na mais profunda merda, lentidão e descaso do sistema. Nesse livro o mocinho não usa gel, não casa, não tem quatro filhos e um cachorro, e nem mora em uma bela casa branca com cerca e um grande jardim florido. Nesse livro a verdade é outra, pois as cercas são as cercas da prisão, do estado, do medo e o seu cão, esse é um Vira-Latas pulguento chamado Xôla.
Vejo que poucos policiais fazem o que fazem por que gostam. Talvez aqueles que quando crianças imaginavam revólveres com qualquer graveto ou objeto, e passavam tardes inteiras brincando de polícia e ladrão. Mas o que me parece, é que muitos têm um sério problema de conduta e respeito – esses tem os dedos nervosos prontos para dar um tiro no primeiro dentista negro que dirija um belo carro, por confundi-lo com um bandido. Muitos, não fazem diferença entre o valor da vida e do respeito, e só querem uma desculpa para descontar suas frustrações e angústias. Por que eles iriam se incomodar? Tratava-se de um casal de baixa renda, desses que vão à praia aos sábados e domingos e passam a tarde escutando brega e enchendo a cara de cachaça. Não são gentes para o estado, são um estorvo para a elite, e muitos policias levam essa mentalidade tacanha para a vida, mesmo estes não fazendo parte dessa facção criminosa, elitista e demagoga.
Enfim, o ônibus começa a andar – minhas esperanças já haviam se esvaído por completo - quando percebo outros dois policiais na rua, correndo em direção ao casal, prontos para por um fim naquilo. O ônibus se distância, fico um pouco mais tranqüilo, mas meu semblante é de ódio, ódio por aqueles policiais omissos. Tento voltar a ler – já não consigo mais. Pois já estamos num mundo ora Kafka, ora Dom Quixote. Que sorte aqueles policiais com armas de gravetos, terem aparecido pra salvar a donzela dos braços do grande dragão de pedras. Mesmo assim meu semblante não muda, pois sei que no final, nem o Gregor Samsa e nem o Josef K saem ilesos, pois é assim no mundo de Kafka, e é assim no mundo real.
3 comentários:
bela dualidade registrada:
mundo real, mundo kafkiano.
e não saio ilesa também daqui.
e respondendo ao comentário de outrora:
não sei se a nossa natureza manda em alguma coisa, visto que a cultura também nos constitui, e também é nossa 'natureza', assim dizendo.
mas da cultura violenta nos vemos presos, alienados: 'humanizamos' coisas, coisificamos 'humanos'.
alguma coisa grita doído em nós.
C*... que post!!!
Vivemos neste individualismo desenfreado... num consumo conspícuo!!! uma correria sem tamanho... ninguém para pra pensar... pra observar as estrelas... pra conversar sobre o dia... etc!!! a Televisão faz isso pela gente... a TV acabou com as famílias... com os bate-papos!!! a TV nos tirou a sensibilidade!!!
Ah... nunca lí Kafka... que pena!!!
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