É verdade, eu nunca pensei que meu estado de revolta pudesse chegar a um estágio tão avançado. E nem foi tão difícil assim. Quando olho ao redor, quando ando nas ruas, vejo TV, ouço rádio – é na verdade eu nem ouço rádio, mas tudo bem. Sabe, quando se chega nesse nível tudo é tão transparente como as águas do caribe ou da privada. Da água pro vinho, ou seria do leite para a cachaça? Não importa, pois o que vale no final é conseguir enxergar além dessa névoa que insiste em pairar no ar, sobre nossas cabeças ou sob nossas vistas. Pode ter certeza meu caro, que o poder da grana está impregnado no mais simples detalhe, do barroco ao clássico, do renascentista ao moderno, da insígnia do capitão da polícia ao número de série raspado da arma que o traficante leva na cintura. Da hóstia do padre à coroa do papa. Da faixa do presidente às contas numeradas em bancos da suíça com dinheiros desviados. Do sorriso irritante de um deputado à idade exata de uma prostituta infantil em sua cama de motel. Em cada canto, lá estará ela, corrompendo, manipulando, estuprando e assassinando.
Você assiste a TV e de repente tudo é falso, impregnado de moral, regras, normas e condutas, que castram, te privam, te prendem, sempre com um propósito. O seu trabalho é uma droga, e de repente você percebe o quão é explorado, humilhado, manipulado. O estado passa a ser um maldito Talk Show idiota apresentado pelo mais completo desgraçado com rosto plastificado e maquiado da TV, sorriso medonho e dentes fluorescentes com aparelhos de néon. Os religiosos te condenam ao inferno quando deveriam ajudar – a África definha em Aids e fome enquanto o Vaticano se afoga em dinheiro e condena o uso da camisinha quando não tem a menor capacidade de condenar seus padres pedófilos. O novo salvador surge e é tão mentiroso que o cheiro de naftalina e formol e um pouco de cal em seus cabelos condenam seu verdadeiro caráter. Sabe meu velho, é justamente aí que conseguimos abrir os olhos, mesmo com tanta terra e desentupidor de pia jorrando em nossas íris. Aí irmão, aí não tem pra mais ninguém – pois quando chegamos nesse estágio, os elos das correntes do autismo imposto se quebram, e a fúria que carregamos dentro de nós é tão destruidora como o desabrochar de uma flor na primavera parisiense de 68.
As bombas são jogadas ao vento, entre molotovs e carros tanque, você sabe que ali é o seu lugar. De frente ao batalhão de choque, a gestapo contemporânea, você os enfrenta com estilingues e punhos cerrados, máscara negra no rosto e coração pulsante. Pelos oprimidos e contra os opressores, inquisitores modernos da nova igreja quadrangular do liberalismo transcendental. Você se joga à sorte e a sorte se joga contra você. O medo lhe arrepia os poros, mas já sabes que é tudo ou nada meu chapa. A liberdade ou a prisão maquiada? A Matrix existe, e sinto lhe dizer meu caro que tu vives nela. Que pílula então tu escolherás? A azul, a vermelha ou a negra? Não importa, pois tu tens uma pílula dentro de ti - enxergue-a! E esta meu amigo, não precisa de cor ou dogma, apenas de vontade de viver, de lutar, de amar, de ser livre e de ser feliz.
sexta-feira, janeiro 19, 2007
Quando passamos a enxergar além das frestas do caixão de nossos dias.
segunda-feira, janeiro 15, 2007
Alguém que sangre por você
*Curtindo de leve as férias! Tinha até me esquecido disso aqui. Acabei tirando férias dos meus textos também. Colocarei uma poesia marginal minha apenas pra não deixar esse blog entregue às aranhas, ácaros e baratas...
Depois espero voltar com mais crônicas.
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No fantástico show de horrores de cada tempo há de surgir
Alguém para sangrar e te mostrar
Que os espinhos no caule são flores em campos minados
E todo comprometimento do eu, é só uma tarefa à cumprir
Ninguém quer pisar na lama com seus sapatos importados
Exercitam o dedo e a lábia, só falácia... só falácia...
Seus colarinhos são muito brancos para sujar de sangue
E ele não tem nada à perder - juventude e punhos tão dispostos
Teorias, ideais ou utopias - todos tem!
E podem até discernir sobre tudo isso
Sentados em poltronas entre um placebo e um soma
Enquanto no campo de batalha só Quixote sangra
E então sangrou tanto que morreu
Morreu por ti, morreu pelas novas gerações
E as novas gerações chegaram, sem saber que ele existiu
Um novo Mártir há de surgir, pra sangrar por todos vocês
Por todos nós...
Sempre o mesmo ciclo, e ainda assim... não aprendemos!
*2 Imagem = Carlo Giuliani - Manifestante anarquista e poeta Italiano, assassinado aos 23 anos de idade pelas forças repressoras em Gênova, Itália, numa manifestação contra o G8.
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